11 de outubro de 2014

O Demiurgo de Platão e o Deus judaico-cristão: Análises e críticas. (Parte I)

Disseram certa vez que quem fez Filosofia foi Platão, depois dele tudo é apenas comentário! Comungo quase que inteiramente desta opinião. É indiscutível que assim como Cristo dividiu o calendário da História, Platão dividiu o calendário da Filosofia. Quem não conhece sequer uma introdução básica ao pensamento platônico está descredenciado a compreender o pensamento filosófico e mesmo teológico ocidental. Platão influenciou diretamente e indiretamente diversificadas escolas de pensamento filosóficas- religiosas e místicas, inclusive a nossa escola cristã, não foi por acaso, que em um aprofundamento teológico que tive a feliz oportunidade de fazer, fui surpreendido a princípio quando o Mestre disse que, o Cristianismo é mais platônico que Cristão! Ora, ao menos no que diz respeito a construção da nossa Teologia, em seus primórdios, temos uma profunda influência do pensamento platônico, evidencia clara é S. Agostinho de Hipona, o que mais Agostinho fez, senão tentar "cristianizar Platão", isto é, sua construção teológica parte de uma interpretação platônica com as lentes da fé cristã. O célebre filósofo Nietzsche chegou a afirmar "Cristianismo é platonismo para o povo!". A obra de Platão é imensa e seus temas são plurais, como não é nosso objeto de discussão aqui e este espaço seria incabível, nos basta como ponto de partida, saber que Platão ofereceu uma cosmogonia a humanidade. Em sua cosmogonia, isto é, uma teoria da origem do Universo, temos um protagonista, a saber, o que Platão chama de demiurgo.
     Em muitos níveis se faz notar a influência de Platão no pensamento cristão, mas dentre alguns, excetua sua teoria da origem do Universo. Em sua magnífica e complexa obra (difícil e de impossível compreensão a quem não tem um conhecimento preliminar de Platão) chamada Timeu, Platão trabalha três temas:

1. A Origem do Universo, sua composição e funcionamento;
2. A Origem do Homem e sua anatomia física e metafísica;
3.  O "Mito de Atlântida".
     
     Vamos nos deter no primeiro tema. Ao contrário do cristianismo que defende uma posição da creatio ex nihilo, ou seja, uma criação a partir do nada, Platão defende uma matéria pré existente, em sua teoria havia "desde sempre", uma matéria totalmente desorganizada que ele denomina de Caos, o "deus" ou como é mais original em Platão, o demiurgo simplesmente teria trabalhado como um artífice ou organizador daquele grande caos. Partindo de um arquétipo, tipo de forma ideal, o demiurgo utilizou a matéria desorganizada preexistente organizando e "criando" um universo ordenado, que denominou de Cosmos. Ao contrário do Deus concebido na Teologia cristã, que segundo S. Agostinho, trabalha com o princípio de providência, isto é, está totalmente ligado a realidade material e interage com ela a todo momento, dialogando e punindo ou providenciando aos homens, em Platão tudo isto inexiste! Teorizou o grande filósofo que na realidade o demiurgo criou, na linguagem platônica, o que se chama alma múndi, ou seja, assim como o homem tem uma inteligência que o rege, que costumeiramente chamamos de alma, da mesma forma, o mundo tem uma alma, uma inteligência que a rege, que poderíamos simplificando chamar de leis físicas e naturais. Portanto, bem parecida com a moderna concepção deísta de Deus, Platão propõe um deus totalmente indiferente e ausente da realidade existencial do ser humano. (Claro que a teoria platônica é bem mais complexa, mas aqui cabe um ensaio simplificado!).
     A Teologia judaico-cristã, neste quesito é a antítese da tese platônica! Basta abrir o Primeiro Testamento e o que encontramos é um Deus totalmente antropomórfico, isto é, com formas e sentimentos característicos do ser humano: Ama, odeia, prioriza, persegue, pacifica, incita, é ciumento e colérico, por fim, temos um Deus totalmente inflamado e insuflado de sentimentos humanos. Se isto te impressiona, ao caminhar pelas páginas do Novo Testamento, os autores neotestamentários superam seus predecessores: Deus não apenas tem sentimentos humanos: Ele próprio se faz homem! (Continua...)

2 comentários:

  1. por isso que prefiro ao estudar transliterar algumas palavras do novo testamento para o hebraismo afim de que entenda melhor no que realmente autor estava querendo dizer dentro de sua cultura

    ResponderExcluir
  2. Grande blog e textos muito profundos. Você tem algum contato? Sou leitor de Dawson, me situo entre a filosofia e o cristianismo. Há um livro de 1930 do Dawson que aproxima muito do tema do seu texto: Inquérito sobre Religião e Cultura.

    ResponderExcluir